sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Tarô: amigo ou juiz?


Bete Torii
Conforme tenho visto, existem duas tribos praticamente "adversárias" que lidam com o tarô: uma, menor, trabalha com ele como auxílio oracular para considerar (pensar sobre) momentos de vida, tendências, alternativas etc. Outra, maior e que congrega cartomantes e tarólogos, lida com o tarô como objeto oracular e mágico que serve para mapear áreas da vida e predizer o futuro.
Esse segundo grupo, na sua maior parte, prefere tarôs redesenhados que já por si elegem (se reduzem a) uma fatia dos significados possíveis dos arcanos mais antigos, e ainda tendem a escolher metodologias que afunilam esses significados. Entendo que, do ponto de vista da previsão e nesta época da grande valorização dos resultados e da eficácia, seja necessário ter um receituário bem definido. De outro modo, como um tarólogo sem dons de vidência poderia decidir qual dos muitos significados possíveis de um arcano cabe em cada caso?
Acontece que fazer interpretação unívoca de uma carta e assumir uma predição que vai influenciar a vida do consulente são atitudes que carregam risco e encargos. Estudantes e praticantes de tarô deveriam tomar consciência disso. Há tarólogos/cartomantes sensatos que, com os anos de experiência, adquirem uma segurança grande quanto ao que falam e não falam, mas uma pessoa nova na atividade, ansiosa para "acertar", pode causar estragos. E o estrago será tanto maior quanto mais esse tarólogo achar que tem que demonstrar competência dizendo o que vai acontecer com o consulente.
Eu acho que, ao contrário, a mais "nobre" função do tarólogo é justamente traduzir a pergunta (geralmente fechada, ansiosa) do consulente para um formato de tiragem que ajude a destrinchar a questão e a orientar reações a ela.


"O templo de Afrodite" - aprendendo a ler

Ouvi recentemente, pela segunda vez, uma apresentação da tiragem Templo de Afrodite [veja a descrição em http://www.clubedotaro.com.br/site/p52_2_simples.asp#Afrodite] com exemplificações assertivas do tipo "se o resultado é Torre, acabou a relação, não tem jeito". Como a tiragem é muito interessante, eu resolvi experimentá-la, fazendo-a algumas vezes seguidas, cada vez para um casal bem próximo de mim - casais de diferentes idades, formados recentemente ou há até 10 anos, que conheço com razoável clareza e sei que estão muito bem.
Pois em cada tiragem saíram no mínimo 2 cartas "ruins", segundo a tradição da cartomancia, e eu fiquei pensando como seria terrivelmente lamentável se uma dessas pessoas, principalmente as mulheres, tivesse ido a uma taróloga que, para essas mesmas cartas, vaticinasse algo de seriamente errado com seu relacionamento.
Quase sempre saiu a carta 9-Eremita, por exemplo - tanto para ele como para ela. Nos dois casos em que saiu no plano mental, minha interpretação foi de que a pessoa leva a relação a sério e sua intenção é de continuidade. Interessante: em ambos os casos, o parceiro dessa pessoa para quem tirei O Eremita é razoavelmente mais velho, e a relação é uma oportunidade de amadurecimento. Uma das vezes, a carta saiu no plano sexual para a mulher, e suponho que ela seja mesmo um tanto reservada, longe do tipo fogoso - embora sem nenhum problema ou rejeição, tampouco.
Duas vezes saiu A Papisa para a mulher. No caso em que veio no plano mental, interpretei como receptividade, feminilidade: ela assume a relação de forma bem esclarecida e refletida. No plano emocional, interpretei como reserva e discrição, além da feminilidade. De fato, é uma mulher afetiva, mas que nunca dá bandeira e guarda seu jeito carinhoso para ambientes & pessoas íntimas - entre as quais o parceiro.
A Torre também saiu duas vezes! No caso da mulher para quem saiu no plano sexual, eu acredito que o presente casamento, para ela, é mesmo um momento de liberação, prazer, orgasmo - depois de um período de vida em que teve alguma tristeza e situação de dedicação só ao trabalho. No caso em que saiu no plano mental de um homem, eu até me espantei e, não resistindo, conversei com ele para saber se estava com idéia de romper o casamento. Neca! Essa tiragem reproduzida ao lado, aliás, é um exemplo incrível.
Vejam a minha leitura - que não é definitiva, obviamente, mas foi delicadamente "conferida": Ele tem pensado em se libertar de certos pudores/preconceitos (A Torre) e adotar aditivos químicos para ter certeza de continuar dando prazer à mulher, por quem se declara ainda "amarradão" (O Pendurado) e por quem sente muito desejo (O Diabo). Ela é devotada e fiel a ele, sentindo uma ligação muito séria tanto mental como afetivamente. Sexualmente, suponho que a ligação seja para ela algo de profundo, radical, plutoniano (A Morte). E o resultado: a relação segue firme e forte, de forma serena (A Força).
E aqui fica um recado específico: uma fase necessária e muito instrutiva do aprendizado da interpretação das cartas é o teste, a prática de tiragens sobre situações próximas e já conhecidas - para criar um repertório próprio. Dizendo de outra maneira, trata-se de construir um vocabulário com seu tarô e entender como é que as cartas falam com você.

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